quinta-feira, 26 de maio de 2011

RESSACA!


Quase duas semanas após o término da Titan Desert, ainda estou em fase de ressaca! 
O apetite é exagerado, apetece-me comer este mundo e o outro, pelo contrário a vontade para treinar é quase nula!  
A ressaca não se deve só aos 6 dias da Titan. É certo que foi uma semana bastante desgastante, com muitas horas em cima da bicicleta, pouco descanso, e alimentação desequilibrada. Mas os mais de 3 meses de preparação específica para esta aventura, foram o que mais mossa deixou, a nível físico e psíquico. Primeiro porque já não estava habituado a treinar tantas horas semanais, e segundo porque a maioria das sessões de treino foram feitas dentro de uma garagem depois de 8 horas de trabalho.
Falta apenas um mês e meio para a minha próxima aventura - Transalp - mas não me sinto ainda em condições para voltar de novo para a sala das torturas (leia-se garagem)!

Enquanto a vontade não chega, tenho-me limitado a participar nas maratonas ao fim-de-semana. Ah, e ontem (quarta) fui até Sintra na bicicleta de estrada. Mas em ritmo muito pachorrento, demorei 4h40 numa volta que costumo demorar 4h20.

Em jeito de balanço final da minha participação na Titan Desert, e agora mais a frio, apesar de todas as dificuldades e até alguns aspectos que eu considero terem sido falhas da organização, valeu a pena. Se soubesse na altura o que sei hoje ... teria ido na mesma. O convivio e o companheirismo dos tugas, as imagens das paisagens e da população local que ficaram gravadas na minha retina, e o reencontrar antigos colegas, seria razão suficiente. Mas como se não bastasse, ainda trouxe o troféu que ambicionava, e mesmo não estando personalizado com um simples: "1. Master 2011" irá para o móvel de troféus que tenho na sala de jantar.

Ao menos podiam ter personalizado o troféu!

Se estou a pensar voltar à Titan Desert? Tinham que me pagar muito bem!

E para finalizar o projecto Titan, resta agradecer a todos os que tornaram possível esta minha aventura no deserto:
- GoldNutrition: pela flexibilidade de horário que me proporcionou para poder treinar convenientemente nestes 3 meses; pelo fornecimento dos suplementos a toda a Meo Team, e que foram fundamentais para o sucesso deste projecto. Todos os Meos foram Finishers e de excelentes condições de saúde.
- Meo: pelo apoio financeiro que tornou viável a concretização deste projecto Meo Team e ainda pela simpatia dos seus representantes;
- BikeZone: pelo fornecimento da Cannondale Flash Ultimate;
- Shimano: pelo fornecimento dos sapatos de BTT capazes de aguentar a dureza do deserto;
- Garmin: pelo fornecimento do Oregon 450, ideal para este tipo de aventuras com orientação por GPS;
- Evoc: pelas condições especiais na aquisição dos sacos Evoc de grande volume. Muito resistentes e capazes de transportar mais de 30 quilos de material;
- Maxxis: os pneus CrossMark LUST 2.1 comportaram-se de forma exemplar! Em 6 dias de puro BTT, em trilhos de pedra solta, e outros de lascas afiadas, não tive um único furo!
- Hilzy: mesmo sem quaisquer condições para exercer o trabalho de mecânica, o Hilário nunca baixou os braços, e a não ser a avaria que tive na suspensão Lefty, porque já foi para Marrocos com problemas, não tive problemas mecânicos;
- Asics: pelo fornecimento da roupa de acampamento a toda a Meo Team;
- Inverse: pelo fornecimento da roupa de competição a toda a Meo Team;
- FisioTorres: graças às massagens da Ana e do Ricardo, os meus músculos estavam melhores de dia para dia;
- Seur: que nos transportou as nossas bikes de e para Granada;
- Agência MilDestinos: pela simpatia e cuidado que tiveram na programação da nossa viagem de autocarro de e para Granada;
- Ao Paulo Quintans: capitão da MeoTeam, por me ter dirigido o convite, e ter tratado de grande parte da logística e trabalho burocrático;
- Ao Marco, Celina, Pedro, Nuno, Nelson, Sérgio e Tiago, pelo excepcional ambiente que criaram na Meo Team;
- Aos restantes Tugas que nos acompanharam nesta aventura. Éramos apenas 24, mas dávamos mais nas vistas que todos os outros participantes juntos :)
- AngelMinds: por todo o trabalho de comunicação que empreenderam antes e durante a nossa participação na Titan;
- A todos os amigos, os mais pessoais, e os de FaceBook, pelo incentivo e apoio durante os meses de preparação e depois durante o decorrer do Titan;
- Lena: a minha outra metade, pelo apoio, dedicação, incentivo, paciência, ...sei que não foi fácil, sobretudo aturares-me naqueles dias em que as coisas não estavam a correr tão bem. 

Se me esqueci de alguém, volto a este texto e crio adendas ;)

Encerrado que está a Titan Desert, segue-se já a Transalp, de 16 a 23 de Julho. Prova realizada por duplas. Eu farei equipa com o José Silva. Juntos seremos a Team Garmin/GoldNutrition. Objectivo? Tanto eu como o Zé, somos muito competitivos, se bem que neste preciso momento, a minha vontade era de ir para a Transalp para desfrutar das paisagens. 
Mas tenho esperança que durante os próximos dias, a ressaca passe, e eu voltarei de novo aos treinos ...na sala das torturas.
Até breve.

quarta-feira, 18 de maio de 2011

Rescaldo - parte 2 - "Corte de Corrente"


Felizmente fui sempre dos primeiros a terminar as etapas. Quase sempre por volta das 12h já tinha cortado a meta. A rotina era sempre a mesma: trocar o roadbook, que era obrigatório levar comigo na etapa, pelo roadbook da etapa seguinte; receber o 1,5lt de água a que tinha direito todos os dias após terminada a etapa; entregar a bicicleta ao Hilário (mecânico); procurar o meu saco no meio de 500. Esta tarefa estava um pouco facilitada porque os sacos estavam divididos em 3 grandes montes por número de frontais dos atletas; procurar a minha tenda, que era sempre a número 74; dirigir-me o mais rápido possível para os duches, enquanto havia água, aproveitava também para lavar os sapatos, o capacete, os bidões e o camelbak; beber o Fast Recovery; ir para a massagem, e por fim, almoço. O resto da tarde, era para descansar, pôr a conversa em dia, e preparar tudo para o dia seguinte. Enquanto isto, os participantes vão chegando durante toda a tarde. 



O segundo dia foi o primeiro dia da etapa maratona. A etapa maratona consiste em duas tiradas. A primeira com 103km e a segunda com 137km. As horas que dividem estas duas tiradas, são de auto-suficiência, isto é, não temos mecânico, nem massagista, nem duches, nem tendas, nem camas. A organização fornece apenas, almoço, jantar, pequeno-almoço, e um toldo onde colocamos os nossos sacos-camas para pernoitar. Também havia lavatórios para uma higiene mínima, mas rapidamente terminou a água.
Assim, no segundo dia do Titan, tivemos que transportar carga extra. Para além do saco-cama, alguma roupa para vestir após a primeira tirada da etapa maratona, algum alimento, os suplementos essenciais, nomeadamente Fast Recovery, Goldrink, barras e géis para o segundo dia, toalhetes para a higiene pessoal e alguns para limpeza da bike, algumas ferramentas e material suplente. 

Depois de ter terminado a primeira etapa bastante desgastado (físico e psíquico) e com bastantes dores musculares, devido à queda, às cãibras, ao ritmo da prova e à avaria da suspensão, a minha condição e a moral no segundo dia não estavam em alta. No entanto, quando se deu o tiro de partida, mais uma vez posicionei-me na frente. Nos primeiros 2km o ritmo até era confortável, mas logo de seguida o checo Martin Horak atacou fortíssimo! Ainda tentei seguir o grupo da frente, mas de imediato vi que era impossível. Na frente seguiram uns 15 atletas, e eu fiquei apenas com Eleuterio Anguita, um velho conhecido da estrada, que foi meu colega nos 2 anos que competi numa equipa espanhola. Seguimos os dois durante 10km aproximadamente. Depois apanhámos mais 3. Mais tarde, Anguita fica para trás e eu sigo com os outros 3. Pedalámos juntos mais de 20km. Depois fomos apanhados por um grande grupo (cerca de 20) no qual vinha a líder feminina – Rebeca Rush. Foi nesta altura que tive um corte de corrente. Pensei: “vão uns 20 na frente, estou todo dorido (sobretudo mãos, braços e costas), a principal adversária da minha colega Celina vem aqui comigo, e eu não faço ideia se a Celina vem próximo ou mais atrasada!”. Naquele momento decidi esquecer a luta pela classificação Master, e aguardar pela Celina para tentar ajudá-la. Já estava farto de sofrer atrás daquelas “bestas”. E este sofrimento não estava a dar frutos. Com esta decisão queria desfrutar mais do percurso, das paisagens e ao mesmo tempo ajudava a Celina que ainda estava a lutar por um lugar no pódio, ao passo que eu naquela situação estaria arredado dos 3 primeiros. E assim esperei. Fui devagar 5 minutos…10 minutos…15 minutos…20 minutos…entretanto passaram uns 3 grupos e alguns ciclistas solitários. Todos passaram por mim e eu não passei cartuxo. Entretanto chega o grupo onde Celina vinha integrada. Eram uns 10-15. Os restantes 20km que faltavam para chegar ao acampamento foram para puxar pela Celina para que perdesse o menos tempo possível para Rebeca Rush. Terminada a 1ª tirada da etapa Maratona, tinha ficado decidido que iria levar o resto do Titan Desert mais na desportiva, até porque nesse dia terei perdido uns 30-40 minutos para Manuel Beltran e o grupo da frente.
 Mas a meio da tarde, e por curiosidade, fui ver as classificações da tirada. E tal não é o meu espanto que, apesar de ter descido de 14º para 18º na classificação geral, subi de 4º para 3º na classificação Master! Afinal, tinha havido mais “cortes de corrente” naquele dia. A primeira etapa tinha deixado mossa a muito boa gente. Não foi só a mim.
Decidi então não baixar os braços ainda, e que no terceiro dia (2ª parte da etapa maratona) iria mais uma vez tentar aguentar o ritmo do grupo da frente e ficar na expectativa a ver se mais algum adversário directo cederia. Nesta altura o líder da categoria Master, Manuel Beltran, já tinha mais de uma hora de vantagem, mas se conseguisse ficar no top 3, também não seria mau de todo.

Ao terceiro dia, realizámos a tirada mais longa da história do Titan Desert - 137km!
Mais uma vez tentei seguir com o grupo da frente durante alguns quilómetros, pelo menos para fugir á confusão inicial. Passados uns 20km, optei por levantar o pé e seguir o meu ritmo, pois estava sujeito a dar o estoiro. A etapa era muito longa. Primeiro pedalei alguns quilómetros a solo, depois num grupo de 7-8 - nesta altura caí mais uma vez mas sem gravidade, só alguns arranhões – e por fim, 6 ficaram trás, e os últimos 40km foram feitos com o líder da categoria sub-23. Resultado final: subi um lugar na classificação geral, e reduzi o tempo de diferença para o 2º classificado master. Já para Beltran perdi mais alguns minutos! Mas as sensações físicas iam melhorando a cada dia que passava.

Quarto dia, a etapa mais dura em solo marroquino, caracterizada pela muita pedra que iríamos apanhar. Apesar de já termos mais de 300km nas pernas, e pouco descanso, mais uma vez saiu-se a 1000 por hora! Mas desta vez consegui aguentar melhor o grupo da frente, apenas composto por cerca de 10 elementos, e Manuel Beltran não era um deles. Mais uma vez, quem impunha um ritmo muito forte neste grupo era o checo Martin Horak. Rolámos muitas vezes a quase 40km/h, e ninguém ia á vontade na roda do campeão checo. Rolei neste grupo até ao quilómetro 50 aproximadamente, altura em que começou o troço mais complicado coberto de lascas de pedra. Sem roda 29’’ ou suspensão total era praticamente impossível seguir no grupo da frente! Aliás, eu, Horak e Oscar Pereiro, éramos os únicos com roda 26’’ no grupo dianteiro, só que Horak e Pereiro tinham suspensão total e eu quase não tinha suspensão … da frente! Apesar de me sentir bem, tive mesmo que ceder e seguir o meu ritmo. Passados os 15km do troço em pedra, aumentei o ritmo e ainda consegui passar por 2 ciclistas que iam na frente. Nessa etapa fiz 10º e subi ao primeiro lugar da categoria Master. Isto porque Manuel Beltran não apanhou o comboio da frente. E o grupo em que vinha integrado, por um erro de navegação, perdeu-se. Beltrán nesse dia chegou quase 1h30 depois de mim. A faltar duas etapas para o final do Titan, era 12º da classificação geral e líder da classificação Master, com 17 minutos de vantagem do espanhol Manuel Beltran.

A quinta etapa foi a mais curta – 61km – e também a mais rápida – 33km/h. Mais uma saída a fundo, mais uma vez apanhei o comboio da frente, e mais uma vez Manuel Beltran ficava para trás. Com isto consolidei a minha liderança, tinha agora 45 minutos de vantagem. Parecia ser uma vantagem confortável. Mas todo o cuidado era pouco. Faltava uma etapa duríssima em solo espanhol, e um pequeno azar ou descuido podia colocar em risco a minha vitória em Masters.

Depois de uma noite muito mal dormida e a alimentação ter sido quase nula, no Sábado arrancámos de Alba (Espanha) para a última etapa. Momentos antes, ainda tive uma situação de bastante stress. O amigo Jota tinha trazido de Portugal uma suspensão Lefty para substituir a que estava estragada. E o Rui Silva (Barbo Racing) tinha a delicada missão de fazer a substituição em “cima do joelho” e sem as ferramentas mais apropriadas. Serviu-se apenas de um minúsculo alicate, que andava comigo no camelbak para alguma emergência, um conjunto de chaves de sextavadas e um taco de madeira. Felizmente e graças á experiência do Rui neste tipo de situações de stress competitivo como mecânico oficial da equipa Yamanha (motocross) tudo correu bem, e na última etapa, finalmente tinha uma suspensão da frente :)

A última etapa tinha 110km com 2.500 de subida acumulada. Subidas longas junto à Serra Nevada. Foi o dia que me senti melhor. Quando Milton Ramos, principal adversário de Roberto Heras, atacava nas subidas mais inclinadas, só ficávamos 4 na frente: Milton, Heras, Pinto e eu. Todos os outros cediam. Depois o grupo abrandava e alguns ciclistas juntavam-se ao grupo. Isto aconteceu algumas vezes, e notava-se realmente que havia vários atletas muito justos de forças. Entretanto, e por momentos, perdemo-nos duas vezes. Tinham retirado algumas marcações colocadas pela organização. Isto foi pretexto suficiente para alguns atletas (aqueles que iam mais justos) convencerem os outros a fazer um pacto de não agressão durante o resto da etapa. Todos concordaram (ou quase todos). A partir daqui segui-mos num ritmo moderado. Mesmo assim, alguns descolavam nas subidas mais longas. Beltran foi um deles. Terminadas as subidas mais duras, alguns lançaram-se nas descidas finais. Eu não quis arriscar, pois na situação em que estava tinha garantida a vitória na categoria, e segui no meu ritmo. 

No final dos 6 dias de competição tinha conseguido o meu objectivo principal – vencer a categoria Master – e fiquei apenas a 1 lugar do meu objectivo secundário – o top-ten da classificação geral. Quem diria?! Depois de logo ao segundo dia pensar que já não teria hipótese de atingir o meu objectivo! 



Só podemos fazer o balanço de uma prova por etapas, após todas terem sido concluídas. Numa prova de BTT com esta dureza, em que a capacidade de recuperação é o factor mais importante para um bom resultado, em que as condições, fornecidas pela organização, para esta recuperação são escassas, todos os truques são importantes. No meu caso em particular, e no caso de toda a equipa Meo Team, em que todos foram finishers, um dos truques utilizado, foi uma boa suplementação nutricional. Como já referi a alimentação era desequilibrada.  Mas toda a Meo Team estava bem suplementada, ou não tivéssemos o alto patrocínio da GoldNutrition (uma curiosidade: Roberto Heras também o tem). O Fast Recovery, o Goldrink Premium, o SAFE, o ZMA, o Magnésio, o Tribulus, o Muscle Repair e ainda o Kyo-Dophilus (da marca Kyolic) foram peças fundamentais no sucesso de toda a Meo Team, do Roberto Heras e do meu em particular :)

(talvez continue)

segunda-feira, 16 de maio de 2011

Titan Desert: Rescaldo (parte 1)

Terminou a minha primeira grande aventura em BTT. Foram 6 dias de prova e mais 3 de viagens e preparativos bastantes cansativos.
A minha participação nesta aventura quase dava para escrever um livro, mas vou tentar resumir em dois ou três textos. Aqui vai o primeiro.
 
Meo Team
 

Não foi propositado, mas se calhar comecei logo pela prova de BTT mais dura do mundo. E esta dureza não se deve unicamente ao tipo de percurso e quilometragem das etapas, mas sobretudo às restantes horas do dia que passámos sem a bicicleta em que, o que mais sobressaia era a falta de condições de descanso, alimentação e sobretudo higiene. 
 

Foi sem dúvida um teste à capacidade e resistência física e psíquica dos cerca de 550 participantes desta edição do Milenio Titan Desert, e em que cerca de 20% não conseguiu concluir este desafio.
Quando aceitei o convite dos meus amigos que estavam a formar o projecto MEO TEAM, nomeadamente o Paulo Quintans que já tinha participado nas duas edições anteriores do Titan Desert, preparei-me psicológica e fisicamente para a dureza de uma prova desportiva no deserto e tudo o que isso implica. O Paulo já nos tinha dado bastante informação para que fizéssemos essa preparação da melhor forma. Mas o que nós não esperávamos, nem o Paulo e os outros portugueses da comitiva que já tinham participado em edições anteriores, é que as condições desta prova pioraram significativamente este ano, sobretudo porque a organização não acompanhou o aumento significativo do número de participantes. Faltaram condições básicas, não só aos atletas, como a todo o staff que acompanhou as equipas. As instalações sanitárias eram em quantidade muito insuficiente, assim como a água para a higiene pessoal.
Havia filas de espera para tudo. Os ciclistas que chegavam um pouco mais tarde das etapas, tinham que esperar horas para conseguirem tomar banho, porque só havia 15 duches para mais de 700 pessoas. A água faltava muitas vezes, ao ponto de alguns desistirem de tomar banho. Os sanitários ainda eram em menor número. Isto obrigou a que muitos optassem por fazer as suas necessidades em redor do acampamento. Alguns faziam-no tão próximo que o cheiro chegava às tendas onde dormíamos. Eu, depois de uma ou duas vezes ter deparado com cenários nojentos nos cubículos sanitários, optei por pegar na minha bicicleta todos os dias de manhã antes do inicio da etapa, e pedalar para longe do acampamento para fazer as minhas necessidades de uma forma mais privada e até mais higiénica.
A comida para além de ser pouco variada, era de fraca qualidade de confecção e sobretudo de higiene. Passámos as duas refeições principais a que tivemos direito diariamente, durante os 6 dias de competição, a comer: massa demasiado cozida, pão, arroz, atum, lentilhas, tomate e frango cozido. Tudo isto confeccionado sem sal. Em 2 ou 3 jantares ainda tivemos direito a uma carne adocicada (que não cheguei a descobrir que animal era aquele) em que umas vezes veio em forma de almôndegas e outras em pedaços cozidos com osso e gordura.
O pequeno-almoço, que deveria ser a refeição mais reforçada e equilibrada, era ainda mais fraco: café, leite, sumo de laranja (alguns dia já azedo), pão duro de dias torrado no dia anterior, cereais tipo “cornflakes” e “chocapic” do mais rasco que existe e carregado de açúcares baratos, manteiga e compota de morango e pêssego. Tudo isto bem acompanhado de pó, moscas e calor. Não é de estranhar que uma grande percentagem dos participantes tivesse sofrido de problemas intestinais e gástricos. Felizmente e muito graças á suplementação todos estes problemas de saúde passaram ao lado de toda a MEO TEAM.

Após cortarmos a meta de cada etapa, tínhamos direito a 1,5litro de água, que tinha que dar para o resto do dia. Mas como é óbvio, não chegava! As próprias bebidas das refeições tinham que ser pagas. Uma Coca-cola ou uma cerveja custava 4 euros e cada 1,5 litro de água extra custava-nos 3 euros. Tudo servia de negócio para encher os bolsos da organização. O acesso á Internet custava 20 Euros por cada 30 minutos, quando funcionava!

As tendas onde dormíamos eram de 3 pessoas. Fiquei sempre com os meus colegas Marco Chagas e Celina Carpinteiro. A organização dizia que cada tenda teria 5 por 3 metros, o que não seria mau, se fosse verdade! Mas tínhamos espaço para colocar os nossos sacos, estes dormitórios eram construídos de mantas, inclusive o telhado. Quando chovia a água caía em cima das nossas camas, tínhamos que nos tapar com cobertores, e o cheiro destas mantas (ou tapetes) era desagradável. Cheirava a camelo. Aliás, os lençóis e mantas das nossas camas estavam repletos de pêlos curtos, não sabíamos se eram de camelo ou se tinham sido usados em dias anteriores por outros participantes. Uma coisa é certa, não eram lavados.
 
Uma das avenidas do nosso acampamento

Como se isto já não tornasse difícil o nosso dia-a-dia e rendimento em cima da bicicleta, o dia que tivemos que viajar de barco até Espanha foi ainda mais duro!

Depois de termos terminado a quinta etapa, começou todo o processo de viagem para Alba (Espanha), local onde se iria dar o inicio da última etapa. Começámos por tomar banho num complexo marroquino em que tinha apenas 8 duches. A maioria não conseguiu sequer tomar banho decentemente. Até as mangueiras que se encontravam a regar os jardins do complexo serviram para alguns atletas. Eu felizmente como era sempre dos primeiros a chegar aos acampamentos nunca tive problemas para tomar banho. Depois foi a vez de encaixotar as bikes para depois entraram nos camiões que as iriam transportar até Alba. As bikes foram tal e qual como terminaram a etapa, nem limpas em afinadas. Em seguida veio o almoço no complexo, para não variar, massa, atum e tomate. E por fim, massagem. Por volta das 15h os autocarros que nos iriam transportar até Mellila, onde nos aguardava o barco, começaram a sair. Depois de cerca de 1h30 de viagem cheguei a Mellila (Marrocos) por volta das 17h. Depois de mais umas filas e de andar a carregar o saco de um lado para o outro, cheguei àquele que iria ser o meu dormitório na próxima noite. Era um cubículo com 2 beliches para 4 pessoas. Mal dava para colocar os sacos. E o calor era insuportável. Mais uma vez os meus colegas foram o Marco e a Celina. O jantar no barco estava marcado para as 19h. Por volta das 19h30 quando me dirigi ao restaurante do barco, assustei-me! Havia uma fila enorme para entrar dentro do mesmo. Dei meia volta, porque não iria estar menos que uma hora para conseguir jantar. Às 20h30 regressei de novo ao restaurante, e a fila estava exactamente do mesmo tamanho. Não me restou outra alternativa senão esperar! Cerca de 45 minutos depois, entrei no restaurante. Apanhei um tabuleiro e fiquei espantado quando vi a comida. Um arroz que mais parecia massa consistente, um bocado de atum, um pedaço de pão duro e uma minúscula porção de frango cozido. Mais um bolo e uma sopa instantânea. E não se podia repetir! O arroz, não o consegui comer e a sopa não inspirava confiança. Restou-me colocar o atum dentro do pão e depois comer o bolo. E foi isto o meu jantar.
 
A especialidade da "casa": Arroz cimento frio.
 

Depois de assistir ao briefing, que só terminou à meia-noite, fui-me deitar. Tivemos que deixar a porta da camarata aberta por causa do calor.
Passadas cerca de 5 horas, o despertador tocou. Parecia que tinha acabado de me deitar! O pequeno-almoço era das 5h30 às 7h00. E a saída do barco seria às 7h30. Às 6h30 dirigi-me ao refeitório, depois de mais 20 minutos de fila de espera tinha á minha frente um tabuleiro com 3 tostas de pacote, 1 pacote de manteiga, 1 de compota e 1 café. E não se podia repetir! Também podia ter comigo uma taça de cereais rascos com sabor a amendoim. Mas dispensei.
E foi este o pequeno-almoço para fazer uma etapa de BTT com 115km e cerca de 2500 de acumulado, dali a 4 horas.
Em seguida equipámo-nos e carregámos os sacos, cerca de 1km até aos autocarros que nos iriam transportar até Alba. Após uma hora e vinte de viagem, chegámos a Alba. Faltavam duas horas para o inicio da última etapa. Junto à partida havia alguma comida para os atletas (bananas, pão e alguns bolos secos). Com o stress da troca da suspensão (irei contar esta história mais tarde) comi apenas uma banana. A primeira coisa a fazer quando chegámos a Alba foi procurar a caixa com a nossa bicicleta e montá-la.
Com 5 horas de sono dormidas num cubículo que mais parecia um forno, e sem termos ingerido qualquer alimento decente nas últimas 20 horas, às 11h de Sábado, partimos para a última e mais dura etapa do Milénio Titan Desert 2011.

Na última crónica que escrevi quando já estávamos em viagem para Marrocos, defini como objectivo principal no que respeita a resultado desportivo, lutar pela vitória na categoria master. E como disse também, mesmo sem saber quem seriam os meus principais adversários. Tinha consciência da minha forma física, fruto da dura e intensa preparação que realizei durante 3 meses. Faltava saber quem seriam os principais adversários e em que condição física se apresentariam nesta prova. Como segundo objectivo, apontei também um lugar no top-ten na classificação geral.
Quando chegámos ao hotel onde iria começar a primeira etapa e onde estavam instalados cerca de metade dos participantes, comecei a cruzar com caras conhecidas do pelotão internacional do ciclismo de estrada. Alguns deles já os tinha visto na lista de inscritos, nomeadamente Oscar Pereiro, Roberto Heras, Euleutério Anguita e Melcior Mauri. Este último seria para mim um dos principais adversários à luta pela vitória em masters. Aliás, o Mauri já tinha ganho uma edição do Titan Desert. Mas também me cruzei com ilustre do ciclismo mundial, e que não sabia que iria estar presente: Manuel Beltrán (40 anos), mais conhecido por Triki. Um grande trepador, que foi pedra fundamental nas vitórias de Tony Rominger, Miguel Endurain e de Lance Armstrong no Tour de France. Em 2008 terminou a sua carreira na equipa Liquigás, devido a um teste positivo de EPO.
Em conversa com Triki, disse-me que estava ali só para desfrutar da prova e que não tinha treinado muito, mas como esta é sempre a lengalenga dos ciclistas, fiquei na expectativa e passei a contar com mais um nome de peso para lutar pela vitória na categoria Master. Mais tarde fiz uma pesquisa na net, e descrobri que o Triki tem participado em provas de BTT em Espanha e inclusive tinha ganho a última em que participou.
Logo na primeira etapa todas as minhas dúvidas acerca dos meus adversários ficaram esclarecidas. Triki foi o terceiro da etapa, atrás de Roberto Heras e de Milton Ramos. Eu apanhei 29 minutos de Triki e Melcior Mauri foi apenas 73º a mais de 30 minutos de mim. Concluí também que afinal a minha fasquia talvez tivesse sido colocada demasiado alta, face ao andamento do grupo da frente. Mas esta primeira etapa, para além de ter sido das mais duras desta edição do Titan, tive demasiados problemas que prejudicaram a minha prestação.
Após ter feito o troço das dunas no grupo da frente, grupo este composto por não mais que uma dezena de atletas, os problemas começaram. Entre o quilómetro 10 e 15, uma queda com mais 3 atletas do grupo. Bastou um desequilíbrio em cima da areia de um elemento do grupo para atirar comigo e mais dois para o chão, tipo peças de dominó. Depois desta queda demorei uns 15 minutos a conseguir chegar de novo ao grupo dianteiro. Depois comecei a notar a frente da minha Cannondale cada vez mais baixa. Começava a escorregar no selim e sentia cada vez mais as irregularidades do chão. Esta etapa tinha bastante pedra solta. Descobri que a minha suspensão tinha perdido todo o ar, e estava completamente em baixo! Como se não bastasse, uma correia do meu camelbak (mochila de água que levava ás costas), desprendeu-se! Se eu parasse para prender a correia nunca mais apanhava o grupo. Este rolava a mais de 30km/h…com vento de frente! Eu já ia no limite na roda do grupo, as minhas costas doíam cada vez mais, assim como os meus pulsos e braços. Nesse dia também estavam mais de 35ºC e a ameaça de cãibras era cada vez mais evidente. Tentei por várias vezes dar um nó na correia em andamento, mas não estava a conseguir. Enquanto isso, tinha que ir segurando o camelbak pelo tubo da água. Cheguei a um ponto que já não aguentava mais a ginástica que estava a fazer para segurar o camelbak. Tive mesmo que parar um minuto para prender o camelbak. Este minuto foi o suficiente para não mais apanhar o grupo. A partir do momento que perdi o comboio da frente, o desgaste de pedalar sozinho contra o vento foi aumentando. Já perto do final da etapa acabei por ser alcançado por um segundo grupo. Mesmo sentindo bastantes cãibras, aguentei até ao final o ritmo deste grupo. Consegui nesta etapa um 14º lugar e fui o 4º Master. Esta primeira etapa causou-me um desgaste enorme. 
Neste dia pensei muitas vezes o que estava ali a fazer e qual a necessidade de tanto sofrimento. Tanto treino nestes últimos meses para conseguir apenas um 4º lugar em Master logo na primeira etapa, e já a quase meia hora do primeiro! 
 
Aqui, já com a suspensão "em baixo".
 
 
Como se não bastasse a minha Lefty estava avariada. Pelos vistos já veio assim de Portugal. Nesse dia o Hilário, nosso mecânico, também me disse que tinha os rolamentos da roda da frente gripados, e que com muita sorte eles aguentariam até final do Titan. Nesse dia valeu-me a ajuda de um grande especialista em suspensões: Rui Silva da Barbo Racing. Com as poucas ferramentas que tinha disponíveis, conseguiu colocar a Lefty de novo operacional para a segunda etapa.
Para além das pernas, as minhas costas, mãos, pulsos e braços estavam um farrapo. A Ana da Fisiotorres teve muito trabalhinho para me recuperar para a segunda etapa.
Depois da minha prestação nesta primeira etapa, teria que decidir se deveria redefinir os meus objectivos para esta prova.

(continua)

sábado, 7 de maio de 2011

DIA -1: Expectativas?

Faltam 2 dias para a primeira etapa do Titan Desert.
Neste momento vou no autocarro em direcção a Granada, juntamente com a restante comitiva portuguesa. São 22 atletas, entre os quais a Meo Team, 2 fisioterapeutas da Fisiotorres, o Hilário da Hilzy, como mecânico e o Tiago da Angelminds como assessor de imprensa.

Para trás já ficou a parte mais difícil, que foram 3 meses de preparação. Não foi nada fácil! Sobretudo conseguir ânimo para ir para cima dos rolos depois de um dia de trabalho. Os próximos 7 dias serão para desfrutar ao máximo o trabalho que fiz até aqui.
Expectativas? Esta será a primeira vez que participo numa prova de BTT internacional por etapas. Estou no completo desconhecimento do que me espera, seja ao nível da dureza da prova, seja ao nível dos adversários, sobretudo o nível competitivo dos mesmos.
Conheço a minha actual condição física, mas não faço ideia do que andam os outros participantes desta aventura.

Quando inicío uma preparação para uma competição desportiva, coloco sempre um ou mais objectivos. Desta forma torna-se mais fácil concentrar-mo-nos e delinearmos o treino. Já o fazia quando era ciclista profissional. Geralmente não divulgo estas metas pessoais, isto porque há uma grande probabilidade de não as atingirmos. Mas como já não sou profissional e já não tenho nada a provar ou a justificar, não tenho problema em divulgar as minhas metas para esta prova, mesmo correndo o risco de falhar redondamente.
O Titan Desert tem várias classificações e categorias. Eu estou inserido na categoria Master Masculinos, que é para participantes entre os 40 e os 50 anos. Nesta categoria quero disputar o primeiro lugar, e digo isto mesmo sem saber quem são os adversários. Também há uma classificação geral, que engloba todas as idades. Nesta classificação seria excelente conseguir um lugar entre os 10 primeiros. Não esquecer que vou competir com jovens de metade da minha idade, e alguns mais velhos mas que se dedicam a 100% a este tipo de competições.
Mas o BTT tem mais variáveis que o ciclismo de estrada, e que interferem na prestação desportiva de um atleta. Há mais probabilidades de furos, quedas e avarias. E ainda por cima não há assistência durante as etapas. Podemos fazer uma preparação exemplar para estar ao mais alto nível numa prova de BTT, mas se temos a infelicidade de ter uma avaria que nos obriga a parar 10-20 minutos, a hipótese de discutir a vitória fica de lado. Foi o que me aconteceu no SERPA160 deste ano.

Mas como o resultado desportivo não é a razão principal da minha participação nesta e em todas as provas de BTT, pelo que me contam de anos anteriores, vou-me divertir bastante e será uma experiência inesquecivel que tentarei partilhar durante o decorrer do Titan Desert.
Não sei se será possivel actualizar diariamente o meu Facebook e este blog. Este ano existe internet no acampamento. Mas para além de ser caro (20 Euros por cada 30 minutos) não sei se o acesso ao "webcenter" será muito requisitado.

Em último caso, farei depois um resumo, com imagens e video incluidos.

Quero agradecer a todos os amigos, inclusive os de Facebook, aos meus familiares, principalmente à Lena, minha companheira de vida, e a todos os parceiros que estão comigo nesta aventura, nomeadamente a GoldNutrition, a BikeZone, a Cannondale, a Fullwear, BBB, a Shimano, a Garmin, a Maxxis, a SMP e a minha amiga e massagista Cristina Ponte. Para além destes meus parceiros pessoais, um agradecimento à MEO, à Asics, à Inverse, à Seur, à Hilzy, à Fisiotorres e à Hcpubli, todos estes parceiros do Projecto Meo Team no qual estou inserido, e que ainda fazem parte o Marco Chagas, o Nelson e Sérgio Rosado (dos Anjos), o Pedro Duque, o Nuno Margaça, a Celina Carpinteiro e o Paulo Quintans.
O projecto Meo Team tem como um dos principais objectivos  divulgar e angariar fundos para a Associação Acreditar. Qualquer um pode contribuir para esta causa. Basta fazer uma transferência bancária para o NIB: 0035 0259 0000 215913 003, que foi criado unicamente para este projecto. O valor reverte na íntegra para esta associação. Não existe valor mínimo a transferir. Basta comprar um quilómetro por um Euro. Eu ja comprei uns quilómetros, e tu?

Mais informação sobre este projecto em http://titan.meo.pt Neste website também podem acompanhar etapa a etapa a aventura da Meo Team no Titan Desert :)

Até breve.